29 abril 2015

Entre boxeadores e bailarinas

Uma vez me disseram que os problemas, não são problemas. São oportunidades. Sim, é por causa de complicações que alguém se torna herói, sobrevivente, gênio, intelectual, exemplo... A cada dia que passa, é possível ver o mundo como um balé. Você tem que ficar na ponta do pé, postura ereta e saltar. Imagine o quanto deve doer para uma bailarina poder manter todo o equilíbrio do corpo sem perder a leveza.

A bailarina foi treinada, desafia-se desde criança. Aprendeu a superar a dor nos músculos, pés, braços e a queda. Elas caem. Caem até acertar o salto, o passo e o ritmo. Elas choram quando não estão escaladas para um papel importante, mas lembra de tudo o que superaram.  É diferente com os meros mortais que não conseguem nem bater palmas no ritmo da música? Não. Caímos, levantamos e com postura nos revelamos bailarinas e bailarinos dançando diante dos obstáculos da vida. É claro que não podemos ser treinados diante de um espelho para sorrir diante do “não”, “te aviso se algo surgir”, “isso entre nós, não está dando mais certo”, “eu te traí”, “ela não resistiu”. Um espelho do teto ao chão não faria diferença. A sapatilha não faria diferença.

Um saco de pancadas faria. Um nocaute faria. Um ringue com pessoas gritando o seu nome e apostando em você faria a diferença. A raiva, o medo e a desesperança precisam ser colocados para fora em forma de socos em um saco pesado. O boxeador também é treinado para superar a dor física, a derrota e queda. Dançam - não como bailarinas e com vestidos cintilantes - com passos atentos para esquivar-se e perceber o golpe antes de senti-lo. Nem tudo se resume a angústia. Um boxeador sente o gosto salgado de ferro do sangue nos lábios, mas isso não é o bastante para fazer hesitá-lo. Se metaforicamente alguns corações sangram e não sentimos o cheiro do cobre ou vemos a ferida exposta... Deveríamos parar?  Parar de esquivar-se, de saltar majestosamente, de sorrir para o público e vencer a luta com o juiz levantando nossas mãos? Deveríamos parar de ficar na ponta dos pés aguardando a entrada final para reconhecer na platéia os rostos daqueles que amamos orgulhosos?  Ao caírem, a bailarina e boxeador possuem duas opções: levantar e mostrar que há capacidade para continuar o espetáculo ou continuar no chão sentindo as dores do mundo e mostrar fragilidade.

O que fazemos? Ficaremos no chão ou continuamos o show? Eu prefiro prosseguir com o show, caso gostem ou não do repertório. Bem, sentir a temperatura da areia utilizando o meu rosto nunca foi a minha praia. E ter apenas Samara de “O Chamado” como amiga no fundo do poço é deprimente. Escolhi sacudir a poeira, escalar as paredes do poço e viver entre bailarinas e boxeadores. E como se diz em francês: ascenseur ballerine . Que significa “levanta bailarina” para quem não foi alfabetizado em Francês. Eu também não fui.

Sempre estaremos entre o plié e nocaute, mas eis que a vitória chega para ambos. Não importa se você usa luvas ou sapatilhas.


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